A rua por onde não passaste
A rua por onde não passaste cruza uma grande avenida. As alamedas das avenidas possuem macaquinhos agéis que te espiam quando tu pisas calçadas largas e antigas faixadas portuguesas.
Na rua por onde não passaste há uma construção e nela o chão se arrebenta lá fora na calçada, a água limpida escoa; o homem de avental observa esta nascente urbana, estudioso chega a conclusões científicas.
A rua por onde não passaste tem um cenário ideal quando seus cinzas e beges se quebram pelo rosa das copas dos ipês vaidosos vestidos de cor de rosa claro como a delicadeza que esperas em teu mundo.
Nesta rua por onde não andas há uma padaria aberta e o cheiro de pão invade as narinas dos transeuntes famintos naquela hora da volta prá casa, inclusive daqueles miseráveis que costumam transitar por estas ruas onde quem sabe até a bondade humana, nesta rua por ande não andas, ofereça o pão no final do dia acompanhado de algo quente para se beber: café preto pingado.
A iluminação é tênue nesta rua por onde não pisas e te busco em todos os rostos humanos imaginando se tu és mesmo parte da humanidade ou um ser a parte que se recusa a andar por aqui e dividir comigo esta mesma calçada larga e generosa que há tantos anos nos viram de mãos dadas.
A rua por ande não andas está coberta de um céu impossível de um cinza médio arroxeado com espaços vazios entre as núvens, convite para uma viagem ao infinito. Este céu que não vês seria mais verdadeiro na tela do pintor que no mundo, constituindo um fundo gótico, fundo de uma instituição cinzenta por onde se advinha uma cruz ao longe. A cruz do teu esquecimento de uma rua triste.
A rua por onde não passaste te espera para sempre quem sabe num dia frio, depois da chuva, com um casaco longo, um guarda chuvas negro e grande enganchado no braço. Teu vulto misterioso compõe uma cena emotiva na rua esquecida e abandonada deste vulto. Então a rua que não passaste esconde por discrição contida seu contentamento enquando a trilhas a pé com o teu sapato preto, mocacim e entras num café, pedes um simples e pela porta envidraçada daquele local observas a rua, a rua que te viu nascer, a rua por onde te atiras num carrinho de lomba, por onde correste, por onde gritaste, por onde amaste, por onde foste comprar um pão para tua mãe... Mas, a rua tão discreta faz que não se lembra disso e os transeuntes todos andam com o olhar taciturno e sério, pensando só em dinheiro e em trabalho, fingindo não sabererem que teus olhos nos meus, quando na rua se encontram podem ser ainda mais belos e doces do que estes ipês cobertos de florezinhas roseas.
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